quinta-feira, 10 de abril de 2008

Insónias e cansaço

Este caderno está pouco estreado; parece pouco vivido, pouco sabido. As palavras fogem-me, quando em tempos me entornavam de todos os poros. E o tempo que antes tinha e agora já não tenho... será tempo que tinha para agir, para pensar?... Pouco agia, por isso escrevia e pensava. Agora pouco penso, agora ajo, mas ainda ajo menos do que queria, quero mais, algo mais. Já tenho muito. Mas talvez queira descanso. Que acabem as provas. Que me saibam, sem que me canse em mostrar que valho. Não tenho tempo para pensar e preciso de descanso. De paz. Aquela das tardes com a minha avó. Agora a vida é um tráfego poluente e incessante de acontecimentos em rodopio, sem pausa, um crescendo acelerado de vidas e experiências, e vivências, provas e mais provas. Falhas. Frustrações. Arrependimentos. Cansaços. Estou cansada. Houve algo que aconteceu. Uma ruptura radical, e, desde então, é uma roda viva sem parar. E ainda não parei. Para pensar, para chorar, para descansar, para retomar o fôlego. Ainda não parei para parar. A vida não espera por nenhum de nós. A vida não dá tréguas, ela espera que suas, que te esfoles, que te esmeres, que te esgotes. Tudo à nossa volta mexe-se, continua em movimento, a rodar, a rodopiar, mesmo que estejas ou queiras estar parado.
Não podes - tu és levado nessa corrente, nesse tremor, nessa catástrofe brutal que nem um tornado. És levado à velocidade da luz, esbofeteado pelos ventos frios, cortantes, cegantes. Vais parar a outra terra. A outro dia, a mais dias. A uns a seguir aos outros. A uns iguais aos outros. A outra vida. À mesma vida, a de sempre. No fundo estás parado e não saíste do mesmo sítio. Mas não significa que estás a descansar, pelo contrário.
É todo este cansaço "à la Álvaro de Campos" que me incita e obriga a colocar as coisas por planos. A estabelecer prioridades. A cansar-me primeiro e só depois vens tu, todos, e os outros. A vida.
Tu ficarás sempre no fundo dos planos, no poço dos sonhos e desejos mais recônditos, se não me procurares. Se não te entregares à luta e a mais cansaço, mas este cansaço é outro, que não cansa tanto. Ou não cansa. Eu não sei. Mas eu não te consigo encontrar por entre a multidão. E estás sempre metamorfoseado nas demais caras enganadoras. Nos enganos de toda a parte. Quando dizes que estás lá, não és tu. E nunca és tu. Secalhar não estás, porque não és. Não seres nada.
Talvez um misto conjugado de caras sob ideias incorpóreas. Não és de tacto, talvez de visão, de mentalização. De sonho, de esperança. De frustração e cansaço que vem depois. De fartura, desistência, inércia. De realidade, conformismo, quem sabe não seja maturidade? Sei que me cansei. De muita coisa.
E não tenho tempo. Não te procurarei. Vem ter comigo e depois logo vemos. Logo nos juntamos. Logo falhamos, logo nos afastamos. Logo fico eu. Logo mais um ciclo de procura acabado. Mas tudo ficou ainda por completar. Deve saber bem, não sei... eu consigo por segundos às vezes mentalizar tudo. Mas foge, dissipa-se, aperta no coração, dói a cabeça do esforço mental e imaginativo. E acaba-se por não se saborear e provar, por não sentir o toque, o ardor, a pulsação cavalgando, batendo nas paredes do peito, fazendo eco, zurzindo nos ouvidos, as mãos trémulas e suadas... A mentalização é pobre de sensações. Nem nos sonhos é possível, porque tudo morre, desaparece, se esquece, e sabemos que foi uma mentira e somos uns idiotas.
No plano real, não sei. Tudo o que descrevi não senti por quem tinha, mas tentei. É horrível ter que tentar. E quando senti, não tinha, não podia sentir, ter, poder. Estava-me vedado e não precisava sequer de tentar. Uma prisão espontânea e voluntária.
Parece que ainda te espero e procuro nos nossos dias e nos nossos sítios. Ou que tragas contigo outra salvação para mim, se é que a terei ou quererei ter.
Parece que te escondes em cada recôndito de engano. Parece que nunca me foste. Parece que não fomos, que não houve. Parece que foi um sonho rápido que passou sem que eu acordasse para ele acabar. Eu não sei o que me espera. Eu gostava de receber um dia uma almofada confortável onde pudesse recostar-me e descansar o corpo, purificar a alma.
Gostava de ser recompensada de todo o cansaço. Gostava de uma vida ainda mais plena, com mais plenitudes, completudes, preenchimentos. Não falta nada, pois não. Mas talvez falte uma certa paz, uma harmonia para comigo própria, uma realização perfeita. Eu suspeito que terei talvez um dia essa sabedoria plena e incontestável. Que nunca me acabem os tesouros que agora possuo e me são garantidos, mas que todos os dias me quer a vida roubar, empobrecer, e eu canso-me também na reconquista deles.
Não vou procurar por tesouros que não me pertencem, nem aqueles que não sei se de facto existem.
Pode haver algo mais, mas que venha até mim.

10/04/08
0h37

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